"Conversas típicas e sem novidade alguma. Agradecem o fim do amargo agosto. Esperançam um setembro com mais flores e menos lágrimas. Pensam em outubro com gosto de fim seco. Até quando vamos ficar equalizando nossas vontades e destilando nossas decepções de acordo com os meses que se passam? Ele não combina comigo, ele usa all star e eu prefiro camisa pólo. Ele é Leão, eu sou virgem. Ela é loira, eu prefiro morenas. Besteira! Tampo os ouvidos ao escutar esse tipo de coisa. Agosto de desgosto só dói para aqueles que querem. Porque é assim que a coisa funciona, no fundo sempre queremos ter um motivo para reclamar de algo para não nos sentirmos sós, vazios, gélidos em nossas carcaças que não nos levam a nada. Nós temos medo de sermos algo mais complexo, de esperar por outros que não sentem, de sentir e nos machucarmos. Colocamos a culpa em tudo ao nosso alcance com uma desculpa mais esfarrapada do que a outra porque é simples assim, porque acabou nossa criatividade de criar verdadeiras razões para nossa infelicidade. Ela estava de tpm e eu curto futebol com os amigos. Eu gosto de rock, ela pop. Odeio chocolate, ela ama jorge ben jor e praia aos sábados. Não faço sexo aos domingos, é deprimente. Só aconteceu porque eu estava bêbada. Só não fiz porque não bebi nada forte. Raras às vezes presencio declarações que sejam de plenitude, felicidade, dessas que a gente não precisa dizer oiestoufeliz! Só aquilo de estar bem consigo mesmo, satisfeito, alegre com cada coisinha em seu lugar. Acho que tem muita gente perdendo o sentido disso que vai escapando por nossas mãos. Desse prazer de curtir cada minuto, de ficar espiando o fim de tarde como se você fosse acabar junto com o dia. Falta sentir de forma real e intensa coisas simples. E não digo doses de álcool, beijos na boca, drogas e noites sem dormir. É algo menos efêmero, mais forte, sinestético até. O gosto de uma música, o cheiro de uma história das páginas amareladas de um livro, a lembrança de um sentimento. Não gosto de ser hipócrita, não pense que um dia seria capaz de dar lição de moral - ela me falta, sempre. Mas sorrio quando caio ao chão, brinco com as pedrinhas no fundo do poço, batuco na acústica do abismo. Porque o mais feliz disso tudo é ter alguém com mãos, sorrisos, abraços para te pegar quando você tá lá embaixo. Isso te faz a pessoa mais completa do mundo, cara! É disso que a gente é feito, derrotas e dias de merda, vontades de pular do 7º andar, desistir e voltar para casa e ir dormir debaixo do edredom da mamãe. Mas são nessas horas, principalmente, que a gente tece as preces, levanta o rosto para os céus e agradece a sei lá quem por viver desse jeito de quem abre os braços para todas as oportunidades. Nunca fui a Paris, guardo postais de Veneza num pacotinho para ver quando estiver num barquinho veneziano, junto dinheiro para saltar de para-quedas, comprei uma caixa de band-aids para uma futura lista de vestibular, almoço sozinha no shopping nos feriados, faço supermercado a pé com sacola reciclável, escondo fotos de um antigo amor numa caixa para num dia ocioso lembrar que ela ainda existe - e ele também, moro sozinha sem pais, irmãos, cachorro, café da manhã pronto e cama sempre arrumada. E no fundo sinto que nada é mais deprimente do que reclamar da falta. Cansei de reis e rainhas se martirizando com motivos fúteis. É pedir demais menos revoltas tolas o tempo todo? Dou adeus para os que ficam aí com a bunda na cadeira e os olhos secos, sorriso murcho, vida sem graça. Não tenho tudo que eu sempre quis e acho isso tão bom. Se me falta algo, meus caros, é tempo para viver tudo que sonho, porque o resto eu tenho de sobra."
Beatriz Marques
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